B. Alan Wallace
Excerto de “Ciência Contemplativa. Onde o Budismo e a Neurociência se Encontram”
ONDE A CIÊNCIA E A RELIGIÃO SE CHOCAM
No sistema educacional norte-americano, e também na mídia em geral, a ciência é comumente apresentada como um conjunto de conhecimentos empíricos sobre mundo natural, descoberto por pesquisadores que são implacavelmente céticos com respeito a todas as crenças e suposições não comprovadas, inclusive suas próprias. As religiões, por sua vez, são comumente apresentadas como promotoras de crenças sobre o universo e o sentido da existência humana, as quais são aceitas por seus adeptos com base na autoridade divina. Assim, a ciência e a religião parecem representar duas atitudes mentais incompatíveis e o conflito entre essas duas maneiras de ver a realidade parece inevitável.
Apesar de haver alguma verdade nessa descrição, em muitos sentidos ela é equivocada e tem gerado muita confusão tanto com respeito à natureza da ciência como da religião. A ciência enquanto método de investigação tem sido um instrumento extremamente poderoso para investigar a natureza do universo e tem contribuído com conhecimentos profundos que mudaram as perspectivas e vidas humanas em todo o mundo. Mas o sucesso da abordagem científica conduziu a desdobramentos especulativos de suas descobertas para áreas da metafísica, onde não existe de fato nenhuma evidências experimental de qualquer espécie. Essa é a gênese do materialismo científico, que é um dogma, não uma teoria científica. A adesão inquestionável a esse sistema de crenças presta um grande desserviço à própria ciência, uma vez que gera confusão a respeito da natureza, capacidades e limitações reais da investigação científica. E é perigosa para a sociedade, porque se o estado aceita sem questionar um sistema metafísico centrado unicamente em interesses materiais, a existência humana fica empobrecida e o caminho aberto para a degradação ambiental e pessoal que é o flagelo da sociedade moderna.
A visão do materialismo científico pode ser resumida nos seguintes termos: o mundo físico é a única realidade que existe. Ele é gerado totalmente por forças naturais impessoais; é desprovido de ordem ou valores morais intrínsecos; e funciona sem a intervenção de quaisquer forças espirituais imateriais, sejam elas benéficas ou não. A vida e a consciência surgiram originalmente no universo totalmente por acaso, de configurações complexas de matéria e energia. A vida em geral, e a vida humana em particular, não tem nenhum sentido, valor ou significado além do que ela própria se atribui. No decorrer de uma vida individual, todos os desejos, esperanças, intenções, sentimentos etc. – em resumo, todas as experiências e ações – são determinadas unicamente pelo corpo e por forças impessoais do meio físico que atuam sobre ela. O fim de uma vida individual resulta no desaparecimento da consciência e na completa aniquilação do indivíduo e, consequentemente, esse é também o destino de toda vida do universo: ela simplesmente desaparecerá sem deixar qualquer vestígio. Em resumo, o homem é fundamentalmente isolado; ele vive na fronteira de um mundo hostil, que é tão indiferente a suas esperanças quanto a seu sofrimento ou a seus crimes. Apenas pela aceitação dessa visão da existência humana e do universo em geral, os seres humanos podem viver de maneira autêntica.
A ciência sempre evoluiu em estreita interação com as religiões e filosofias das culturas em que estão inseridas. A perspectiva acima está intimamente ligada à ideologia materialista de Marx, que se infiltrou na ciência por meio de figuras como a do marxista russo Aleksandr Oparin que, em 1938, publicou um livro de grande influência propondo que a vida tem origem na não vida, sugerindo um fluxo natural do inorgânico para a matéria orgânica. Pode-se ver na descrição acima do universo estreitos paralelos com o existencialismo do século XX, de Sartre e Camus, como também reflexos do relativismo ético de pós-modernistas como Derrida e Foucault. Mas filosofia é filosofia. Não vamos confundi-la com ciência empírica.
O materialismo científico é incompatível com todas as grandes religiões do mundo e tem sido apresentado como conhecimento científico por muitos cientistas proeminentes, ente eles Carl Sagan, Richard Feynman, Jacques Monod, Richard Dawkins, Francis Crick, Edward O. Wilson, Steven Weiberg, Stephen Jay Gould e Antonio Damásio, representando diferentes áreas da ciência. Metodologicamente, é perfeitamente razoável que a ciência adote as hipóteses de trabalho do naturalismo, ou seja, que procure entender o mundo em termos de seus agentes naturais, não sobrenaturais. As teorias científicas, diferentemente das idéias filosóficas e das crenças religiosas, têm que ser submetidas à observação empírica e à experimentação. Mas os materialistas científicos costumam dar o passo seguinte de promover uma visão de mundo que faz afirmações que vão além do âmbito do conhecimento científico.
Contrária à posição de muitos fervorosos adeptos do materialismo científico, a crença nessa visão de mundo não é necessária para o exercício eficiente da ciência. Ela é meramente uma opinião secundária que alguns cientistas têm sobre a existência. A crença tem importância fundamental, tanto na ciência como na religião, mas ela costuma exercer um papel diferente em cada contexto. Na ciência, as crenças que são levadas para a pesquisa e o ensino funcionam como um conjunto de hipóteses de trabalho. Elas não devem ser dogmáticas, mas antes suposições que permitem aos cientistas levantarem determinadas hipóteses. Teoricamente, todas essas suposições estão sujeitas à refutação empírica. As hipóteses de trabalho podem ser adotadas para o propósito de tentar obter avanços na ciência, mas elas têm que também ser encaradas como provisórias, mesmo que algumas delas sejam consideradas “verdades”. De acordo com seus próprios critérios de ceticismo, os cientistas devem manter a mente suficientemente aberta para reconhecer que qualquer uma dessas hipóteses pode acabar sendo rejeitada.
Com passar do tempo, no entanto, as hipóteses de trabalho podem facilmente se transformar em crenças aguerridas e é aqui que entre o dogma. O termo “dogma” refere-se a uma visão de mundo coerente, aplicada universalmente, formada a partir de um conjunto de crenças e atitudes que exige submissão intelectual e emocional. Como tal, o dogma exerce um poder sobre os indivíduos e as comunidades que vai muito além dos meros fatos e das teorias baseadas neles. Na realidade ele pode prevalecer apesar das evidências contrárias totalmente óbvias e a submissão a ele pode se tornar ainda mais aguerrida diante de obstáculos. Existem muitos tipos de dogma, entre eles os religiosos, filosóficos, políticos e científicos.
É comum o cientista ignorar as evidências que contrariam suas hipóteses de trabalho mais fundamentais. Por toda sua ênfase no ideal de ceticismo, a ciência é conservadora e a mudança de paradigma não ocorre facilmente. Nesse sentido, o dogma pode ser concebido mais como relativo do que como absoluto. Por um Aldo, fazer ciência implica tomar muitas suposições como crenças, em diferentes graus. Por outro lado, a pesquisa científica é realizada por pessoas e, como as pessoas são governadas por diversas forças – políticas, sociais e outras -, os ideais da ciência podem ser bem diferentes do que ela de fato pratica.
O DOGMA DO MATERIALISMO CIENTÍFICO
Os cientistas não são mais isentos de dogmas do que os políticos, os filósofos ou os teólogos. Pode-se argumentar, entretanto, que há uma diferença sutil, porém importante, entre as crenças defendidas por cientistas e não cientistas. A grandeza e o prodígio da ciência estão no fato de ela ter se desenvolvido por doze gerações de uma maneira muito mais aberta e receptiva a mudanças do que cada cientista individualmente. Os cientistas são seres humanos limitados, mas a ciência enquanto método parece ir além de muitas das limitações de seus praticantes. Daí o ditado comum de que é preciso que a geração mais velha de cientistas morra para dar lugar a novas idéias, uma vez que muitas pessoas não conseguem aceitar plenamente conceitos radicalmente novos. Devido a tudo isso, pode ser que, no devido tempo, os dogmas científicos atuais acabem sendo desafiados e talvez derrubados. Isso vai, no entanto, depender de as sociedades e culturas futuras viverem por tempo suficiente e com liberdade de pesquisa suficiente para permitir que a ciência continue. A pesquisa que desafia os dogmas da ciência não depende apenas de ser tolerada, mas também incentivada.
Vamos agora examinar mais de perto os princípios essenciais da ideologia do materialismo científico.
Objetivismo
O princípio do objetivismo requer que a ciência lide com fatos empíricos testáveis por métodos empíricos e verificáveis da perspectiva da terceira pessoa. Os fenômenos que melhor se prestam a tal investigação são universais, públicos, controláveis, repetitivos e previsíveis. Na mente de alguns adeptos do materialismo científico, a exigência do objetivismo científico pode também implicar um compromisso com a visão expressa nas palavras do biólogo social Edward O. Wilson: “Fora de nossa mente, a realidade existe de modo independente […]. Dentro de nossa mente, ocorre a reconstituição da realidade com base na absorção sensorial e na organização espontânea de conceitos”. A tarefa própria dos cientistas, segundo ele, é colocar corretamente as representações subjetivas da realidade dentro de nossa mente de acordo com o mundo exterior objetivo. Essa visão, que tem origem na metafísica do século XVII de René Descartes, supõe que o mundo objetivo encontra-se fora do mundo subjetivo das manifestações, inclusive de todas as evidências de nossos sentidos, que são consideradas existentes apenas dentro de nossa mente.
Reducionismo
Conquanto existiam muitos tipos de reducionismo, o “reducionismo categórico” é a tendência a reduzir algo relativamente desconhecido ou pouco entendido a uma classe de fenômenos mais conhecidos e entendidos. Apesar de esse sempre ter sido um método psicológico genérico para adquirir conhecimento do mundo, devido ao curso específico do desenvolvimento dos principais ramos da ciência natural, o reducionismo na ciência seguiu uma orientação especial. Historicamente, foram as ciências físicas que fizeram os primeiros grandes progressos e estabeleceram aquilo que se tornou conhecido como método científico e, portanto, para as gerações posteriores de biológicos era natural procurar entender os organismos vivos em termos de física. O físico Richard Feynman expôs sua visão ao declarar num curso de graduação: “Não há nada que os seres vivos façam que não possa ser entendido do ponto de vista de que eles são feitos de átomos atuando de acordo com as leis da física”. Os cientistas cognitivos, por sua vez, tentam entender os processos mentais em termos dos mecanismos biológicos do cérebro de dos sistemas de inteligência artificial. Da mesma maneira, os estudiosos acadêmicos de religião costumam procurar explicar as experiências espirituais em termos de psicologia, medicina, economia e outros fatores não religiosos.
Em nenhum lugar esse reducionismo categórico é mais comumente aplicado do que ao estudo do comportamento humano e da mente, dois dos mais misteriosos e complexos campos da pesquisa científica. O biólogo Richard Dawkins, por exemplo, afirma que os genes constituem a principal força motriz da evolução e que os seres humanos, como todos os animais, são basicamente máquinas criadas por nossos genes. Escrevendo sobre os genes como se estivessem propósitos conscientes, ele defende que eles controlam o comportamento humano, “não diretamente com seus dedos manipulando os cordões de marionetes, mas indiretamente como os programadores de computador”. No mesmo espírito do reducionismo categórico, o neurologista Antonio Damasio escreve:
Muitos de nós da neurociência somos guiados por um único objetivo e uma única esperança: prover finalmente uma explicação abrangente sobre como o tipo de padrão neural que podemos atualmente descrever com os recursos da neurobiologia, de moléculas para sistemas, chega a se tornar a imagem multidimensional, integrando espaço e tempo, da experiência que temos neste exato momento.
Enquanto estratégia de pesquisa, o reducionismo demonstrou seu valor pragmático muitas vezes na história da ciência. Alguns cientistas adotam com cautela o reducionismo como um método que se mostrou que se mostrou extremamente útil em muitas áreas da pesquisa, sem adotá-lo como uma crença sobre a verdadeira natureza da realidade como um todo. Mas mesmo enquanto método, ele tem suas limitações. Os biólogos, por exemplo, sabem que não podem explicar coisas como comportamento animal em termos de movimentos individuais de moléculas; e os cientistas cognitivos sabem que processos mentais complexos não podem ser entendidos em termos de comportamentos de neurônios individuais.
O princípio do confinamento
De acordo com o princípio do confinamento, mesmo que existissem fenômenos não materiais, eles jamais exerceriam qualquer influência no universo físico. Isso porque o universo está fechado a quaisquer hipotéticas intervenções causais não físicas. Adotar esse princípio como uma hipótese de trabalho faz muito sentido quando os instrumentos de pesquisa se restringem a mensurar os fenômenos físicos. Mas as implicações desse princípio, quando elevado ao nível de verdade metafísica, são enormes, tanto em termos dos limites do conhecimento científico quanto da natureza da existência humana. Em seu livro The Blind Watchmaker, Richard Dawkins transcende o domínio legítimo da ciência quando declara:
A seleção natural, o processo automático, cego e inconsciente que Darwin descobriu, e que conhecemos hoje como a explicação para a existência de todas as formas aparentemente propositais de vida, não tem nenhum propósito em mente. Ela não tem em mente nem nenhuma visão mental. Ela não planeja o futuro. Não tem visão, nem previsão, absolutamente nenhuma visão. Se é possível atribuir-lhe o papel de relojoeiro da natureza, esse é o de um relojoeiro cego.
O físico Steven Weinberg comete o mesmo erro com a afirmação frequentemente citada que faz em seu livro The First Three Minutes: “Quanto mais o universo parece compreensível, mais ele também parece fora de propósito”. Não é que os materialistas científicos não gostem de abordar temas metafísicos. Eles gostam, mas muitas vezes os tomam equivocadamente como conclusões científicas. Com isso, prestam um grande desserviço ao conhecimento tanto da ciência como da religião.
Fisicalismo
O princípio do Fisicalismo declara que o universo consiste apenas de configurações da matéria e da energia dentro do espaço e do tempo. Para entender esse princípio, é crucial reconhecer que a matéria em questão não é aquela com a qual deparamos na experiência cotidiana. Uma pedra que seguramos na mão, por exemplo, é percebida como dotada de certa coloração, textura e peso. Mas todas essas qualidades são atributos secundários que existem, de acordo com uma linha de raciocínio que vem desde Descartes, não no mundo objetivo, mas como representações dentro da nossa mente. A matéria que constitui os alicerces básicos do universo objetivo, de acordo com o materialismo científico, é anterior e separada de todos esses atributos secundários que surgem apenas em relação com um sujeito consciente. As verdadeiras propriedades da matéria são seus atributos primários inerentes que existem independentemente de todos os modos de detecção.
QUAL A EFICÁCIA DO MATERIALISMO CIENTÍFICO?
Um dos argumentos mais comuns em defesa dos princípios do materialismo científico enquanto conhecimento científico é que eles funcionam. Ou seja, que em termos pragmáticos, eles têm se mostrado extremamente úteis. Um segundo argumento em defesa de sua validade baseia-se no fato de nunca ter-se encontrado qualquer evidência capaz de refutá-los. Se essas duas afirmações são verdadeiras, temos que levar a sério a possibilidade de a adoção desses princípios ser necessária para a realização de qualquer tipo de pesquisa científica. Vamos, portanto, agora proceder a uma avaliação do materialismo científico em termos de sua importância e validade pragmáticas.
O objetivismo e as ciências cognitivas
Por sua ênfase no estudo científico de fenômenos universais, públicos, controláveis, repetitivos e previsíveis, o princípio do objetivismo marginaliza tudo que é individual, privado, fora do controle, único e anômalo. Em grande parte, isso esclarece porque a mente só se tornou o objeto de estudo científico três séculos após o início da revolução científica. Mas esses fenômenos, inclusive todos os tipos de processos mentais subjetivos, não são menos reais ou importantes do que os considerados pelo princípio do objetivismo. Priorizar simplesmente a realidade e a importância dos fenômenos objetivos desvaloriza a experiência subjetiva a ponto de ela ser comumente considerada um mero epifenômeno dos processos físicos objetivos “subjacentes” a ela.
Essa tendência, predominante na escola behaviorista iniciada no início do século XX por John B. Watson, marginalizou os modos introspectivos da perspectivas da primeira pessoa de examinar os fenômenos mentais. De fato, Watson foi tão longe a ponto de declarar que os behavioristas teriam que excluir do seu vocabulário científico “todos os termos subjetivos como sensação, percepção, imagem, desejo, propósito e até mesmo pensamento e emoção de acordo com suas definições subjetivas”. Considerar os acontecimentos mentais subjetivos como não existentes, com base apenas em fundamentos dogmáticos, dificilmente pode ser um princípio pragmático útil para o entendimento desses acontecimentos. Apenas recentemente, os cientistas cognitivos começaram a reconsiderar a possibilidade de a introspecção exercer um papel importante no estudo dos fenômenos mentais conscientes e de a experiência subjetiva influenciar as funções cerebrais. A aderência ao dogma do materialismo científico impediu que cientistas enxergassem essas verdades, que há muito tempo são evidentes para os não cientistas.
O domínio legítimo da pesquisa científica, de acordo com o princípio do objetivismo, é o mundo objetivo, que existe independentemente da mete de quem quer que seja. Em termos pragmáticos, os fenômenos são considerados “objetivos” quando são amplamente intersubjetivos; ou seja, quando são apreendidos por uma vasta gama de sujeitos usando diferentes métodos de observação. Tudo aquilo de que somos conscientes se mostra em relação a nossas dificuldades de percepção sensorial e mental. Não temos nenhum conhecimento direto de algo que existe independentemente da consciência. O físico Werner Heisenberg fez o seguinte comentário: “O que observamos não é a natureza em si mesma, mas a natureza submetida a nosso método de questionamento” . E Albert Einstein, seguindo na mesma linha de raciocínio, comentou: “Em princípio, é totalmente errado tentar formular uma teoria com base apenas em magnitudes observáveis. Na realidade, ocorre o contrário. É a teoria que decide o que podemos observar” .
Como fervoroso seguidor do materialismo científico, Wilson proclama que tal visão de mundo objetivista é empírica, radicalmente diferente do transcendentalismo religioso. Ao mesmo tempo, ele reconhece acertadamente que não existe nenhum padrão de medida objetivo com o qual determinar o grau de correspondência entre o mundo físico e as representações mentais. De onde ironicamente se deduz que o mundo real objetivo que, segundo ele, é o domínio próprio da ciência, transcende todos os dados empíricos e pode ser conhecido apenas indiretamente, por meio de representações mentais subjetivas. De maneira que os defensores do materialismo científico como Wilson estão apenas defendendo sua própria versão do transcendentalismo com respeito à existência do próprio mundo objetivo que eles buscam entender.
Reducionismo, o princípio do confinamento e as ciências da vida
Apesar das vantagens óbvias de se explicar fenômenos desconhecidos em termos de fenômenos mais familiares, essa tendência pode também apresentar desvantagens: tal reducionismo pode obscurecer as qualidades únicas das coisas que são significativamente diferentes de outras mais bem conhecidas. Como já mencionamos anteriormente, dos vários ramos das ciências naturais, as ciências físicas se tornaram o modelo de acordo com o qual tanto as ciências da vida como as cognitivas se desenvolveram. Embora haja uma forte tendência a tentar reduzir os processos cognitivos a processos biológicos e os processos biológicos a processos físicos inorgânicos, na realidade, há também uma hierarquia entre esses três ramos da ciência.
As explicações das ciências físicas são necessárias, mas não suficientes para se entender os processos biológicos. Mais concretamente, não há nada nas leis da física que preveja o surgimento da vida no universo. E se os físicos tivessem que restringir suas pesquisas apenas aos métodos teóricos e empíricos da física, ignorando tudo que as ciências da vida ensinaram, eles não conseguiriam definir nem detectar empiricamente a presença de organismos vivos. Igualmente, as explicações das ciências biológicas são necessárias, mas não bastam para se entender os processos mentais. Tampouco nas leis da biologia ou da evolução existe algo que preveja o surgimento dos fenômenos mentais subjetivos no universo. E se os biólogos tivessem que restringir suas pesquisas apenas aos métodos teóricos e empíricos da biologia, ignorando tudo que a psicologia ensinou, eles não conseguiriam definir nem detectar empiricamente os fenômenos mentais. Seguindo essa mesma linha de raciocínio, podemos dizer que as explicações das ciências cognitivas são necessárias, mas não bastam para se entender as experiências espirituais. Com certeza, não há nada nas ciências cognitivas que prenuncie seu surgimento, e os cientistas cognitivos não têm como definir nem detectar empiricamente as experiências espirituais sem recorrer aos relatos na primeira pessoa de quem passou por elas.
Pela adoção do princípio do reducionismo, considerando a física como subjacente à biologia e a biologia subjacente à psicologia, os seguidores do materialismo científico há muito supõem que as ciências físicas não têm nada para aprender com as ciências da vida, como tampouco as ciências da vida têm algo para aprender com a psicologia e esta para aprender com a religião. Mas a partir dessa hierarquia das ciências naturais, talvez seja hora de aplicar uma boa dose de ceticismo científico em tal suposição metafísica.
Antes de concluir o tópico do reducionismo, pode ser conveniente revermos sua aplicabilidade com respeito ao entendimento científico da evolução, que traz importantes contribuições para o conhecimento de como os organismos vivos sobrevivem e se reproduzem. Se o cérebro humano e o sistema sensorial evoluíram enquanto aparato biológico para preservar e multiplicar os genes humanos, como sustenta Richard Dawkins, como é que nós humanos temos a capacidade de sentir amor universal e nos preocuparmos com o bem-estar da espécie humana como um todo? Conforme o próprio Dawkins reconhece, tais fatos “simplesmente não fazem sentido de acordo com a evolução”.
Os seres humanos estão interessados não apenas na sobrevivência e na reprodução da espécie, mas também na busca de sentido e felicidade. Mas o sentido, conforme escreve Wilson, “é o elo entre as redes neurais criadas pela excitação que se propaga, aumentando as imagens e envolvendo as emoções”. Embora a experiência subjetiva do sentido tenha indubitavelmente correlações neurais, reduzir esse aspecto crucial da existência humana à química do cérebro é um total equívoco. A natureza de uma vida com sentido não é mais bem explicada por tal reducionismo do que a beleza de Monalisa é explicada pela composição química de sua pintura. Igualmente, com respeito à busca da felicidade, Wilson reconhece que milhões de pessoas a buscam e, “sem ela sentem-se perdidos, à deriva numa vida completamente sem sentido”, mas ele suspeita que isso possa acabar sendo explicado em termos de “circuitos cerebrais e profunda herança genética”. O materialismo científico não dá nenhuma pista de como os seres humanos podem de fato alcançar a verdadeira felicidade, uma vez que essa é mais uma faceta da existência humana que não faz “sentido de acordo com a evolução”.
O princípio do reducionismo e o princípio do confinamento também se propagam para a questão da liberdade de escolha. Se existe algo como liberdade de escolha, tem que haver alguém que a exerça, para tomar decisões livres. Wilson responde da seguinte maneira: “Quem ou o que no interior do cérebro controla toda essa atividade? Ninguém. Nada. Os cenários não são vistos por nenhuma outra parte do cérebro. Eles simplesmente são”. Se não existe nenhuma identidade individual, ou eu, à parte da função cerebral, a questão da liberdade de escolha parece indiscutível. Mas Wilson não para por aí. A elaboração cerebral oculta da atividade mental, segundo ele, cria a ilusão de liberdade de escolha. O fato de ela ser uma ilusão está, segundo ele, amparando na complexidade inapreensível das influências materiais sobre o cérebro. Em resumo, de acordo com o materialismo científico, a nossa própria sobrevivência depende em parte da manutenção dessa ilusão de que temos liberdade de escolha. Mas se isso é verdade, como também o argumento do materialismo científico de que nós nem existimos enquanto indivíduos que fazem escolhas reais, podemos deduzir que a proliferação do materialismo científico esteja reduzindo nossas próprias chances de sobrevivência enquanto espécie. Porque quando uma ilusão é desvelada – como, por exemplo, quando uma criança fica sabendo que o Papai Noel não existe realmente – sua capacidade de influenciar o curso de nossa vida fica enfraquecida.
A teoria da evolução é uma das mais importantes conquistas da ciência moderna, mas quando submetida às coações metafísicas do reducionismo e do princípio do confinamento, ela não apenas deixa de considerar muitos aspectos importantes da existência humana, mas também os torna incompreensíveis.
O Fisicalismo e as ciências físicas
As ciências físicas foram desenvolvidas para medir e explicar apenas fenômenos físicos, mas o princípio metafísico do fisicalismo declara que tudo consiste de configurações de matéria e energia e de suas propriedades que se manifestam no espaço e no tempo. Os físicos concordam que a matéria consiste de átomos, os quais, por sua vez, são feitos de partículas elementares, como prótons e elétrons. Então, de acordo com alguns físicos proeminentes, as partículas elementares são compostas de cordas existentes em onze dimensões. Operacionalmente, há um amplo consenso quanto aos métodos de medição dos fenômenos físicos e às leis quantitativas que governam suas interações. Mas a verdadeira natureza dessas estruturas básicas do universo enquanto existentes independentemente de todas as medições no mundo objetivo continua envolta em mistério. Alguns físicos argumentam que as átomos não são nada mais do que propriedades do espaço-tempo, mas o próprio conceito de espaço-tempo com suas dimensões não tem nenhuma definição precisa. Outros sustentam que os átomos não são absolutamente coisas, mas antes conjuntos de relações.
Em termos de mecânica quântica, parece cada vez mais duvidoso que as partículas elementares da matéria possam ocupar alguma posição distinta e independente de todos os sistemas de medição. Especialistas expuseram diferentes visões que vão desde a afirmação de que as partículas elementares existem independentemente como entidades reais e distintas até o ponto de vista de que não existe absolutamente nenhum domínio quântico objetivo! Com os avanços da física, o status primário da matéria torna-se cada vez mais vago. O físico Steven Weinberg chega ao ponto de proclamar: “Na receita do mundo do físico, a lista de ingredientes não inclui mais as partículas. Dessa maneira, a matéria perde seu papel central na física. Tudo que resta são princípios de simetria”.
Diante da constatação dessa falta de consenso quanto à natureza e primazia da matéria, os adeptos do materialismo científico podem procurar refúgio na teoria segundo a qual a energia e sua conservação é a substância primária do universo. Mas esse recurso não traz muito consolo, porque, de acordo com Richard Feynman, a conservação da energia é um princípio matemático, não a descrição de um mecanismo ou algo concreto. Ele passa então a admitir que: “É importante compreender que no âmbito da física atual não sabemos o que é energia”.
O mundo material é muito mais complexo da perspectiva do conhecimento científico que se tem hoje do que os adeptos do materialismo científico podem esperar apreender com sua metafísica elementar baseada na visão mecanicista da realidade do século XVII. Parece que para os defensores desse dogma metafísico, a matéria ocupa atualmente o lugar que Deus ocupou tradicionalmente para os teístas. Mas as diversas teorias especulativas desses “materiólogos” provêem pouco apoio à crença de que essa substância misteriosa possa suportar o peso ontológico de todo o universo de fenômenos subjetivos e objetivos.
O papel que a matéria exerce no materialismo científico no sentido de “dar coesão” às coisas é muito diferente do papel que ela exerce atualmente na física, onde “matéria” refere-se à contraparte das teorias matemáticas científicas. O que conta na física é formular corretamente as teorias e testá-las por meio de observações. A maioria dos físicos não se pergunta mais o que é realmente a matéria; tais questões são consideradas irrelevantes. Mas se nem os físicos sabem mais dizer o que e matéria ou energia, a afirmação metafísica de que tudo no universo pode ser reduzido à matéria e suas propriedades manifestas tem que ser revista. Mais que uma redução ontológica de todos os fenômenos objetivos e subjetivos a alguma substância física desconhecida, o princípio do fisicalismo envolve uma redução metodológica do estudo de todos os fenômenos naturais a teorias e métodos de pesquisa das ciências físicas.
Isso nos remete de novo à pergunta: os métodos desenvolvidos para o estudo dos fenômenos físicos objetivos são suficientes para o estudo científico dos fenômenos mentais subjetivos? Nas condições atuais, todas as respostas são declarações de fé, porque é evidente que as ciências físicas e biológicas ainda não explicaram de modo abrangente as origens, a natureza ou o poder causal da consciência como tampouco de nenhum outro fenômeno mental. Grandes avanços foram feitos recentemente com a descoberta dos correlatos neurais de uma crescente gama de processos mentais, mas nenhum deles resolve o assim-chamado “problema difícil” de como esses fenômenos físicos dão origem à experiência subjetiva. Os adeptos do materialismo científico declaram confiantemente que os métodos da física e da biologia já testados pelo tempo acabarão por desvendar o mistério da consciência, realizando a esperança de Antonio Damasio de poder usar os recursos da neurobiologia para explicar de maneira abrangente a experiência subjetiva em termos de padrões neurais. Mas existem fortes motivos para manter ceticismo diante da possibilidade de a neurobiologia conseguir reduzir a mente ao cérebro.
Apesar de séculos de estudos científicos e filosóficos modernos sobre a natureza da mente, não existe hoje nenhuma tecnologia capaz de detectar a presença ou ausência de qualquer tipo de consciência, porque os cientistas não sabem nem o que há exatamente para ser medido. No sentido exato, não existe atualmente nenhuma evidência científica objetiva nem mesmo da existência da experiência subjetiva! Todas as evidências diretas que temos são baseadas na introspecção, mas esse método de observação tem que ser desenvolvido para que possa se tornar um método rigoroso de investigação científica. A raiz do problema vai além de uma inadequação temporária da tecnologia. Está antes no fato de a ciência moderna não dispor de um arcabouço teórico com o qual realizar investigações experimentais.
Os cientistas cognitivos costumam determinar o sucesso de suas pesquisas pela amplitude com que conseguem identificar o “mecanismo subjacente” aos processos mentais. Essa insistência em encontrar explicações mecânicas foi igualmente comum entre os físicos até o final do século XIX, quando se descobriu que fenômenos naturais como o eletromagnetismo nem sempre podem ser entendidos em termos de mecanismos. A física como disciplina amadurecida aprendeu isso pela experiência. Mas os ramos mais recentes da ciência, especialmente as ciências cognitivas, cujos modelos de função neural são em geral baseados na física do século XIX, continuam fascinados pela crença cartesiana de que algo só é realmente explicado se seus mecanismos subjacentes tiverem sido identificados. Os físicos já abandonaram há muito tempo esse ideal; os cientistas cognitivos acabarão sendo forçados a fazer o mesmo por suas próprias pesquisas empíricas.
Dado que os físicos contemporâneos têm pouco interesse pela natureza real e objetiva da matéria, a separação ontológica entre “material” e “imaterial” também precisa ser revista. Desde o final do século XIX, os físicos vêm definido operacionalmente os campos eletromagnéticos como oscilações das grandezas de campo abstrato no espaço. De maneira mais ampla, muitos hoje consideram todas as configurações de massa-energia como oscilações das grandezas de campo abstrato no espaço. Em razão da natureza conceitual dessas grandezas, a consagração separação entre material e imaterial parece se desfazer.
Os proponentes do materialismo científico estabelecem uma distinção bem nítida entre o naturalismo das ciências e o sobrenaturalismo das religiões. E o naturalismo, ou a crença em que todos os fenômenos naturais possam ser plenamente explicados em termos de outros fenômenos naturais, é equiparado ao materialismo. Os defensores do sobrenaturalismo, ao contrário, insistem em que não é possível entender plenamente o mundo sem o reconhecimento do papel em um Deus transcende que criou e que intervém no mundo natural. Como esse debate com certeza se arrastará por todo o futuro previsível, gostaria de aqui apenas desafiar a idéia de que todos os fenômenos naturais tenham que ser de natureza material.
Os campos eletromagnéticos, as ondas de probabilidades da mecânica quântica, os estados de vacuidade da eletrodinâmica quântica e as onze dimensões da teoria contemporânea das cordas podem, com certeza, ser considerados naturais. Mas que importância tem classificá-los como “materiais”? Como os físicos consideraram a matéria como alguma espécie de substância metafísica cujos mecanismos dão conta de todos os fenômenos naturais, é hora de pensar em alternativas às suposições ingênuas tanto do materialismo monístico como do dualismo cartesiano. Enquanto esse último não consegue explicar como os processos mentais não físicos podem influenciar o cérebro, o materialismo monístico tampouco consegue explicar como o cérebro produz processos mentais subjetivos. O materialismo científico dá pouca importância às categorias metafísicas originárias do século XVII e a própria demonstrou que essas categorias são obsoletas.
Influências sobre a educação e a sociedade em geral
Vamos agora considerar as conseqüências da fusão entre ciência e materialismo científico no sistema educacional dos Estados Unidos. O modo comum de ensinar ciências nas escolas públicas não consegue dar a muitos alunos um entendimento claro nem de seus aspectos mais rudimentares. Pesquisas realizadas sugerem que a maioria dos americanos não sabe hoje distinguir um átomo de uma molécula e esta de uma célula; não tem a mínima noção do que seja eletromagnetismo; não sabe a diferença entre uma estrela e uma galáxia; e não sabe nada a respeito de genética nem das linhas gerais da história natural deste planeta. Isso é tremendamente surpreendente se considerarmos a quantidade de dinheiro e de esforço que foi investida nos últimos quarenta anos no ensino público de ciências.
Para alguns adeptos do materialismo científico, como Edward O. Wilson, a ciência tende a dissipar todas as crenças religiosas tradicionais, como a de uma espécie extirpando outra que compete pelo mesmo nicho biológico. Mas pesquisas recentes de opinião pública realizadas nos Estados Unidos sugerem que as evidências empíricas podem não corroborar sua opinião. De acordo com uma dessas pesquisas, a maioria dos americanos acredita em fantasmas, um terço aceita a astrologia e um quarto acredita em reencarnação. Uma pesquisa Gallup realizada no ano 2000 constatou que 83% dos americanos e 49% dos europeus consideram Deus muito importante em suas vidas. Se o confronto entre ciência e religião é visto como uma batalha entre a mente e o coração, parece que o coração está levando a melhor. Enquanto em algumas regiões dos Estados Unidos, a ciência e todos os pressupostos do materialismo científico são ensinados livremente, em muitas outras está ocorrendo uma reação exacerbada na instrução pública contra toda e qualquer teoria científica que contradiga a interpretação literal da Bíblia. Nessas regiões, o abismo entre ciência e religião parece estar apenas aumentando. Mas esse conflito é necessário? Em favor da sociedade como um todo, não se deveria explorar como as duas podem coexistir e quem sabe até se complementar?
O século XX pode ser apropriadamente considerado o século do materialismo científico, pois foi nele que sua visão de mundo adquiriu força total. Foi o século mais importante da história da humanidade em termos de avanços do conhecimento científico, mas também o pior de todos em termos de desumanidade do homem para com o homem e de degradação generalizada de nosso meio ambiente natural. Os déspotas mais sanguinários que o mundo já conheceu, incluindo Stálin, Hitler e Mo Tsé-Tung, conseguiram recrutar os serviços de cientistas para a perpetração de seus crimes contra a humanidade. E muitos cientistas e engenheiros do chamado mundo livre investiram seus conhecimentos e engenhosidade na criação de armas de destruição em massa que hoje aterrorizam a humanidade como um todo. Embora muitos cientistas tenham se mantido fiéis a altos padrões éticos, o arcabouço metafísico do materialismo científico não os incentiva a fazer isso. Na verdade, ao reduzir a subjetividade humana a processos neurais que seguem as leis impessoais da física, ele acaba com qualquer noção de responsabilidade moral.
Vida, liberdade e busca da felicidade
As eleições presidenciais de 2004 nos Estados Unidos revelaram um grau sem precedentes de polarização ideológica e emocional do público americano contra si mesmo e o resto do mundo. A hostilidade entre as facções beligerantes deveu-se em grande parte ao fato de uma não conseguir entender a posição da outra. “Como é que alguém que ama Deus e a pátria pode apoiar Kerry?” era o desafio proclamado nas igrejas e sinagogas por todo o mundo interior dos Estados Unidos. E “Como uma pessoa sensata, bem-informada e que se preocupa com o mundo pode apoiar Bush?” era a questão retórica que ecoava pelas faculdades e universidades de todo o país.
A polarização que caracterizava o público americano hoje está focada em temas familiares como:
Razão versus fé
Fatos versus valores
Mente versus coração
Centros urbanos versus áreas rurais
Cosmopolita versus provinciano
Ciência versus religião
Autoconfiança versus submissão à autoridade
Realismo versus idealismo
Valores materiais versus valor espirituais
George W. Bush encarna perfeitamente um lado dessas polaridades e os valores que ele representa e coerentemente lidera obtiveram o apoio generalizado de uma nação traumatizada pelos ataques de 11 de setembro de 2001. Suas políticas vêm promovendo tão coerentemente a segunda de todas as polaridades da lista acima que ele se tornou um símbolo fortemente atraente para aqueles que tendem para a Direita e um símbolo fortemente repulsivo para aqueles que tendem para a Esquerda. Em conseqüência dessa polarização profundamente antagônica, resta pouco espaço no meio e dificilmente algum espaço para a mediação ente os dois extremos. Muitos cidadãos que apoiaram Bush na eleição de 2004 o fizeram com base no que, a seus olhos, ele representa – especialmente seus valores morais – apesar de perceberem o que ele já havia feito nos quatro anos anteriores e planejava fazer em seu segundo mandato. Muitos eleitores indecisos, por outro lado, recusaram-se a votar em Kerry pelo fato de ele parecer representar tão pouco, apesar das promessas do que faria se fosse eleito presidente.
Essa polarização só pode ser entendida no contexto histórico da civilização ocidental, que está enraizada em duas culturas radicalmente diferentes: a greco-romana e a judeu-cristã. Muitos pensadores influentes, entre eles Santo Agostinho, São Tomás de Aquino, Galileu, Newton e Kant, procuraram reconciliar as visões de mundo, valores e modos de vida promovidos por essas duas culturas. Mas hoje sua incompatibilidade se cristalizou na divisão no interior da sociedade americana e na alienação de grande parte do resto do mundo.
Essa divisão começou como um problema na bacia do Mediterrâneo; dali, ele passou a ser um problema europeu e depois um problema americano; e com a difusão moderna da visão de mundo, dos valores e do modo de vida euro-americanos, ele acabou se tornando um problema global. Os militantes muçulmanos fundamentalistas também prezam muito a segunda de cada uma das polaridades da lista acima; mas diferentemente do presidente Bush, eles abominam a visão de mundo, os valores e o modo de vida euro-americanos, considerando-os contrários a seus próprios valores, visão de mundo e modo de vida baseados no Alcorão. Uma forma de fundamentalismo religioso colide violentamente com outra, apesar de comungarem no sentido mais amplo dos mesmos valores e orientação.
A disparidade entre as heranças greco-romanas e judeu-cristã acabou se tornando algo como uma espécie de distúrbio bipolar no plano social e, naqueles que tentam adotar ambos os pólos, é comum ela resultar numa espécie de “hipocrisia”. Muitos devotos cristãos e judeus apóiam com entusiasmo a pesquisa científica e aceitam os resultados da tecnologia, mas ainda não se entenderam com o fato de as ciências físicas descreverem um universo no qual não há lugar para um Deus pessoal que intervém na natureza e responde às preces de seus fiéis. E fazem vista grossa para o fato de as ciências biológicas descreverem os seres humanos como organismos físicos desprovidos de uma lama imortal dotada de livre-arbítrio. Igualmente, muitos adeptos do materialismo científico são pessoas éticas com um forte senso de responsabilidade social, mas suas próprias visões apóiam a atitude materialista e o consumismo desenfreado que estão destruindo nosso meio natural e solapando os valores humanos. Enquanto reduzem a identidade humana a funções do cérebro eu operam sob o controle das leis impessoais da física e da biologia, eles procuram em vão por qualquer base realista para a responsabilidade pessoal ou ética, sem mencionar qualquer dimensão espiritual da existência humana ou do mundo em geral.
O mundo encontra-se hoje extremamente carente de perspectivas integradoras para curar essa fragmentação existencial. Elas terão que incluir um ideal mediador de uma vida com sentido que leve em conta e respeite ambas as heranças enquanto transcende a sua polarização. Para buscar esse ideal, é preciso que reconsideremos o sonho dos Pais Fundadores da América quando procuraram criar uma nação que preservasse os ideais de vida, liberdade e de busca da felicidade no contexto de uma vida plena de sentido.
Vida: Valorizar a vida de cada ser humano, independentemente de sua nacionalidade, origem étnica ou credo, como também de todos os seres sencientes, humanos e não humanos, inclusive os embriões que são, ou humanos ou em processos de se tornarem humanos, e toda a ecosfera, que é essencial para que a vida viceje em nosso planeta.
Liberdade: Valorizar a liberdade de autodeterminação e exercício de seus direitos humanos fundamentais de todos os povos. Procurar se libertar das causas anteriores do sofrimento e do conflito, que são a ganância e o egoísmo, o ódio e a animosidade, como também a ignorância e a ilusão.
A busca da felicidade: Valorizar o bem-estar de todos. Com inteligência para discernir, buscar nas tradições religiosas da humanidade princípios éticos para se guiar e permitir que os cientistas examinem que tipos de comportamento conduzem realmente a felicidade verdadeira e ao bem-estar de cada indivíduo e da sociedade como um todos. Uma prioridade central dessas pesquisas deveria ser a eliminação da miséria e da fome em todo o mundo. Permitir igualmente que a ciência médica continue a diagnosticar e tratar as doenças, além de garantir assistência médica básica a todos. Permitir que as ciências que tratam da saúde mental explorem a natureza não apenas das doenças mentais, mas também da saúde mental, inclusive os estados excepcionais de equilíbrio e bem-estar da mente.
Como vimos no capítulo anterior, a busca da felicidade genuína, ou plena realização do potencial humano, é um ideal antigo de nossas heranças gregas e cristã. Com certeza, essa felicidade, diferentemente da satisfação de menos prazeres momentâneos, tem que estar baseada na verdade, mas que espécies de verdade? Para os judeus e cristãos, essa é fundamentalmente a verdade de Deus e da criação do homem à sua imagem e semelhança. Para Sócrates, era o autoconhecimento. AS pessoas de inclinação religiosa buscam a verdade de cima para baixo, confiando na autoridade da revelação divina, enquanto as de inclinação científica buscam a verdade de baixo para cima, confiando na capacidade racional e empírica do ser humano. Essas duas abordagens têm se batido de frente, mas será que existe alguma possibilidade de elas se tornarem complementares? O maior empecilho para que se chegue a descobrir é a presença de fortes componentes dogmáticos tanto na religião como na ciência. A religião se tornou em grande medida uma questão de crença e submissão a padrões éticos decretados por ordem divina, enquanto a ciência é dominada pelos princípios do materialismo, os quais para seus defensores são profissões de fé, não dados empíricos cientificamente comprovados.
Nem a religião e nem a ciência pode reivindicar para si autoridade única sobre o entendimento da natureza da identidade humana ou do mundo ao nosso redor. A mente humana não consegue compreender plenamente apenas por meio do exame científico do cérebro e seus comportamentos; a alma humana não pode Sr compreendida com base apenas na revelação divina. A ciência não está equiparada para explorar as dimensões espirituais da existência, porque seus instrumentos foram criados para medir processos físicos. A ciência e a religião podem ainda se provar complementares, mas apenas se os adeptos de ambas voltarem a dar primazia à experiência.
O mesmo princípio é verdadeiro em termos de cultivo da virtude, que tanto Aristóteles como Santo Agostinho reconheceram como indispensável para a busca da verdadeira felicidade. Mas a virtude também tem que estar fundada sobre a verdade. Na realidade, uma vida de virtude pode ser considerada uma vida que reflete a natureza da verdade. A ciência esqueceu esse princípio, como evidência o transcorrer do tempo na vida de um grande cientista, que pode ter um entendimento extraordinário de certos aspectos da realidade, mas que, se não cultivar a virtude, ele não colherá os frutos da felicidade genuína. Porém, a religião também caiu no erro de ignorar as pesquisas empíricas da ciência para determinar que tipo de comportamento conduzem realmente à plena realização humana no âmbito do indivíduo, da família, da comunidade, nação, comunidade internacional e toda a ecosfera. É só permitir que o espírito do empirismo e do questionamento crítico prevaleça para que a humanidade possa explorar e adotar um senso revitalizado de ética e virtude, que é tanto infundido pelas religiões do mundo quanto empiricamente testado pelos métodos da ciência.
Quando as economias globais estão rapidamente exaurindo os recursos físicos não renováveis do nosso planeta, impõe-se a necessidade urgente de explorar os recursos interiores inesgotáveis da mente humana e de utilizá-los na busca comum em favor da vida, da liberdade e da felicidade de todos os seres. Dessa maneira, a civilização humana poderá encontrar harmonia no interior de si mesma e também em relação com o resto da ecosfera.
O MATERIALISMO CIENTÍFICO ENQUANTO DOGMA RELIGIOSO
Uma maneira de determinar se uma ideologia pertence à categoria “religião” é verificar se ela colide diretamente com os dogmas religiosos. Imagine as seguintes afirmações sendo feitas na rede pública de ensino por professores com crenças religiosas sectárias:
Um judeu dizer que Jesus não é Filho de Deus e que os milagres a ele atribuídos no Novo Testamento jamais ocorreram.
Um hindu afirmar não ser verdade que existe apenas um Deus, Alá, e que Maomé é seu profeta.
Um budista dizer que não existe nenhum criador divino que governa o universo.
Um taoista dizer que os judeus não são o povo escolhido por Deus e que ele não fez nenhuma aliança exclusiva com eles.
Um cristão refutar a existência da reencarnação e do karma.
Um muçulmano negar a possibilidade de se alcançar a salvação por meio de esforços próprios, sem fé em Deus.
Nos Estados Unidos, é proibido por lei se fazer qualquer uma dessas afirmações, ou seus contrários, numa sala de aula de escola pública, mesmo que os professores em questão não promovam a verdade do resto de suas próprias crenças religiosas nem preguem seu credo como um todo unificado. Os defensores do materialismo científico, no entanto, fazem todas as afirmações acima, implícita ou explicitamente, em salas de aulas de escolas públicas e promovem seu próprio sistema de crenças como uma ideologia coerente e integrada. Quanto mais a ideologia do materialismo é confundida com ciência no sistema público de ensino, mais podemos esperar que os fundamentalistas religiosos insistam para que suas ideologias também sejam ensinadas nas aulas de ciências. Dessa maneira, aumentará a separação ente religião e ciência.
Nos Estados Unidos, a separação entre igreja e estado está fundamentada na Primeira Emenda à Constituição, que se diz: “O Congresso não criará nenhuma lei com respeito à instituição de qualquer religião, como tampouco proibindo o seu livre exercício”. O propósito original dessa emenda era impedir que o Congresso escolhesse e instituísse alguma igreja em particular no sentido de torná-la o que poderia ser o correspondente americano da Igreja Nacional Inglesa, ou Anglicana. O propósito maior também estava claro: proibir o Congresso de exercer qualquer impacto negativo sobre a liberdade de culto por meio do favoritismo governamental a uma ou outra denominação, reconhecendo-a oficialmente e subsidiando-a como a igreja nacional.
Mas a interpretação amplamente prevalecente vai muito além da intenção original. Com base na Primeira Emenda Constitucional, a Suprema Corte dos Estados Unidos tem repetidamente tomado decisões contrárias ao ensino da religião nas escolas públicas, embora o ensino de história das religiões, de filosofia das religiões, textos sagrados como literatura e religiões comparadas seja permitido. O alcance da emenda constitucional depende da determinação do que é e não é religião.
Na apresentação do materialismo científico de Edward O. Wilson em seu conhecido livro Consilience, ele tem muito a dizer sobre o tema dos propósitos, sentidos e valores humanos, o qual é amplamente considerado o domínio próprio das religiões. Wilson também discorre minuciosamente sobre o destino e as origens últimas e as experiências de nossa vida interior. No materialismo científico, as fronteiras entre ciência e religião se dissolvem e uma nova religião é apresentada como substituta de todas as religiões tradicionais. O objetivo sagrado de sua reverência, respeito e devoção não é Deus nem a iluminação espiritual, mas o universo material, que existe transcendentalmente “fora de nossa mente”. Em outras palavras, o materialismo científico parece ser uma versão moderna da religião natural, ou um neoanimismo, que teve inumeráveis precedentes na história da humanidade anterior à escrita. Enquanto tal, ele parece ser um enorme retrocesso para a humanidade.
Se tivéssemos que seguir a intenção original da Primeira Emenda Constitucional, os adeptos do materialismo científico teriam que, no mínimo, submeter abertamente suas asserções ao escrutínio crítico. Mas como o materialismo científico foi considerado “científico” e não “religioso”, um diferente critério foi aplicado à promoção de sua ideologia. As restrições da Primeira Emenda Constitucional não são apenas burladas, mas também interpretadas erroneamente para que apenas uma doutrina religiosa seja promovida no sistema de educação pública: o materialismo científico. Durante o século XX, o governo dos Estados Unidos interpretou a Primeira Emenda Constitucional no espírito da Revolução Francesa, que perseguia a religião tradicional em nome de uma nova “religião científica”. Isso representa uma grande distância da orientação da Revolução Americana, que aboliu a liberdade do governo para instituir uma religião oficial em favor da liberdade para todas as religiões.
A maioria das religiões é comunal, com suas próprias instituições e rituais, e o materialismo científico não é exceção. A vasta maioria da elite científica – membros da Academia Nacional de Ciências e do corpo docente das mais prestigiadas instituições de ensaio – é composta de adeptos empedernidos do materialismo científico. Assim suas instituições, incluindo universidades estaduais, servem como hospedeiras, ou substitutas das igrejas, para essa fé. E nos países de orientação marxista, onde o materialismo científico é a visão de mundo que domina a sociedade como um todo, os governos têm atuado como instituições no sentido de promover e inculcar essa ideologia. A brutalidade e a intolerância que as religiões tradicionais exerceram são bem conhecidas e foi unicamente por esse motivo que muitas pessoas abandonaram completamente a religião. Lamentavelmente, essas mesmas tendências têm se manifestado nas instituições do materialismo científico. Isso fica mais evidente nos países comunistas, onde os membros de outras religiões têm sido sistematicamente perseguidos, submetidos à conversão pelo uso da força, da tortura e da matança generalizada por professarem outras crenças. Nos países democráticos, tal supressão brutal de crenças que não seguem o materialismo não é permitida, mas pressões mais sutis são comumente impostas contra estudantes e professores para que sigam os ditames do materialismo científico.
Embora as ideologias das religiões tradicionais e do materialismo científico sejam diferentes em conteúdo, em muitos outros sentidos elas são extremamente semelhantes. Conforme Wilson reconhece, os princípios do materialismo científico “não podem ser aprendidos apenas pela lógica; por ora, apenas um salto no escuro movido pela fé pode levar você de um ao outro” . A validação desse salto no escuro movido pela fé, segundo ele, acabará sendo alcançada pelo acúmulo de evidências reunidas por cientistas, com os biólogos na liderança. De maneira que a validação final do credo repousa na autoridade dos futuros biólogos, que assumirão o papel de Messias para redimir a humanidade de sua atual condição de ignorância e ilusão.
O ENSINO DE RELIGIÃO E CIÊNCIA NO SISTEMA PÚBLICO DE EDUCAÇÃO
Desde o século XX, a Primeira Emenda Constitucional vem sendo interpretada no sentido de proibir que nas escolas públicas dos Estados Unidos qualquer religião seja ensinada como a verdadeira e também que, de maneira alguma, uma religião seja adotada como religião oficial. Entretanto, é inegável que as religiões do mundo exerceram uma poderosa e, muitas vezes, ubíqua influência sobre o desenvolvimento das comunidades humanas. Para entender o funcionamento interno de qualquer sociedade e sua relação com outras sociedades, é indispensável o entendimento de suas crenças, práticas e instituições religiosas.
Lamentavelmente, mas escolas de ensino fundamental e médio dos Estados Unidos, o ensino das religiões do mundo tende a ser marginalizado, frequentemente negligenciado ao ponto de os estudantes de segundo grau saberem muito pouco sobre qualquer uma das religiões do mundo, com exceção daqueles que provêm de famílias religiosas. Durante o século XX, as crenças religiosas foram rebaixadas para a categoria de opiniões, as quais podem passar a ser consideradas verdadeiras se a pessoa acredita nelas com suficiente convicção.
Na segunda metade do século XX, a área de estudos religiosos nas universidades seculares surgiu por se autodefinir como contrária à teologia. Consequentemente é exigido dos professores de religião que assumam uma postura de neutralidade diante da matéria que ensinam. Eles têm que pairar acima de sua matéria, por assim dizer, e não pousar em nenhum lugar. Esse distanciamento poderia ser adotado como uma postura pedagógica apropriada desde que fosse aplicada igualmente a todos os tipos de crenças religiosas, inclusive as do materialismo científico. Mas na prática, os escritos de Emile Durkheim, Marx, Freud e outros defensores do materialismo científico são comumente incluídos como leitura obrigatória em classes de religião. A adoção dos princípios do materialismo e do reducionismo promovidos por tais detratores da religião é comumente vista como perspectiva objetiva, uma metodologia adequada de ensino, enquanto todas as outras perspectivas religiosas tradicionais são vistas como subjetivas. E Subjetividade é o principal tabu do materialismo científico. Portanto, não deveria surpreender o fato de muitos estudantes de cursos de religião sentirem desvalorizada sua fé na religião. Eles são instruídos sob o domínio do materialismo científico, independentemente de seus cursos serem de ciência ou religião!
Nas escolas públicas americanas, o ensino de ciência é muitas vezes confundido com o do materialismo científico e essa pode ser uma das razões de os estudantes acabarem aprendendo tão pouco sobre a verdadeira ciência. Como já observamos anteriormente, a maioria dos americanos, devido à sua orientação religiosa, rejeita o materialismo científico e, portanto, é improvável que a quantidade do ensino possa ser melhorada a longo prazo pela identificação da ciência com essa visão de mundo. Além disso, o pior tipo de ensino de ciência é aquele que diz aos estudantes que é errado questionar a autoridade de qualquer dogma. Mais cedo ou mais tarde, os estudantes acabarão percebendo as implicações do materialismo científico e, em muitos casos, isso resultará numa lamentável desilusão pela ciência como um todo.
O modo de lançar luz sobre a relação entre ciência e religião é estimular professores, alunos e pesquisadores a explorar a relação entre conhecimento científico e crença de um lado e conhecimento religioso e crença de outro e, com isso, descobrir onde eles se sobrepõem. Para isso, é preciso trazer de volta o espírito do empirismo genuíno ao estudo de ambas as disciplinas, como também introduzir os estudantes nos contextos ético, histórico e filosófico nos quais as ciências e religiões do mundo surgiram e evoluíram através da história. A ciência tem o potencial de se tornar uma ponte para o diálogo entre as religiões e para os estudos de religiões comparadas, enquanto ajuda a estimular a reflexão filosófica e a aprofundar nossa consideração pelas tradições de sabedoria que herdamos. William James escreve com respeito a isso:
Se permitirmos que o empirismo seja associado com religião, como até agora, só que por meio de algum estranho mal-entendido, ele tem sido associado com irreligião, acredito que uma nova era tanto para a religião como para a filosofia estará pronta para começar… Acredito plenamente que tal empirismo seja um aliado mais natural da vida religiosa do que a dialética jamais conseguiu nem conseguirá ser.
A separação vigente entre ciência e religião é exagerada pelo fato de confundir verdades empiricamente demonstradas com crenças levadas ao dogmatismo. No espírito dos autores da Constituição dos Estados Unidos, é a hora de rever o que eles quiseram dizer com instituição de qualquer religião e seu livre exercício. Ao identificarmos as ilusões de conhecimento apresentadas como verdades nos dogmas do materialismo científico e nas demais religiões do mundo, estaremos abrindo novas perspectivas para descobertas que transcendam as atuais fronteira entre ciência e religião.